Por Felipe Marcelino de Albuquerque
OAB/SC 33.415
O mercado de crédito estruturado no Brasil vive um momento de forte expansão. Os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs) apresentam crescimento expressivo e as projeções para os próximos anos são otimistas. Para quem atua com factoring e securitização, esse cenário representa oportunidade, mas também exige atenção redobrada.
Com mais operações sendo realizadas e regras mais rígidas chegando, uma pergunta se torna cada vez mais relevante: você realmente conhece de quem está comprando créditos?
É aí que entra a due diligence ou, em bom português, a diligência prévia. Não se trata de burocracia ou formalidade. Trata-se de proteção.
O QUE ACONTECE QUANDO A DILIGÊNCIA FALHA
A jurisprudência brasileira registra casos em que securitizadoras e empresas de factoring tiveram créditos adquiridos penhorados ou bloqueados judicialmente. O motivo mais comum? No momento da cessão, o cedente já apresentava sinais claros de dificuldades financeiras, processos judiciais em andamento, débitos fiscais ou trabalhistas pendentes.
Nesses casos, os tribunais têm entendido que a situação de insolvência era "notória" ou, no mínimo, verificável com uma análise minimamente diligente. Em outras palavras: quem compra créditos sem verificar a situação do cedente assume um risco que poderia ser evitado.
Esse tipo de situação não é exceção. É um risco real que pode transformar uma operação aparentemente lucrativa em um prejuízo considerável.
O QUE DIZ A LEI
O Código Civil brasileiro, no artigo 159, estabelece que contratos podem ser anulados quando o devedor já estava insolvente e o comprador sabia, ou deveria saber, dessa situação.
A jurisprudência consolidou elementos que caracterizam a fraude contra credores: a anterioridade do crédito (o credor que questiona já tinha direito a receber antes da cessão), o prejuízo ao credor (a cessão dificultou o recebimento), a insolvência (o cedente não tinha patrimônio suficiente) e o conhecimento (o comprador sabia ou deveria saber da situação).
O ponto crítico está no último item. Se você fez uma análise adequada e documentada, consegue demonstrar que agiu de boa-fé. Se não fez, fica vulnerável.
A CVM TAMBÉM ESTÁ DE OLHO
Para quem opera com FIDCs, a Resolução CVM 175 trouxe mudanças importantes. Orientações recentes da autarquia deixaram claro: o gestor é responsável pela verificação do lastro.
Isso significa que não basta confiar na palavra do cedente ou em documentos superficiais. É preciso ter procedimentos estruturados, controles internos e principalmente registros que comprovem a análise realizada.
A tendência regulatória aponta para exigências ainda mais rigorosas: políticas formais de gestão de riscos, critérios reforçados para análise de lastros, trilhas de auditoria mais completas e integração de dados com plataformas regulatórias.
NA PRÁTICA: O QUE VERIFICAR
Uma diligência bem feita não precisa ser complicada, mas precisa ser completa. Três frentes merecem atenção especial.
Sobre o cedente: Qual a saúde financeira da empresa? Existem processos judiciais relevantes? Há débitos fiscais ou trabalhistas pendentes? A consulta a certidões e a pesquisa em tribunais são o básico, mas o básico bem feito já faz diferença.
Sobre os créditos: Os recebíveis existem de fato? A documentação está em ordem? O sacado confirma a operação? Há alguma disputa comercial que possa afetar o pagamento?
Sobre a estrutura: A operação está em conformidade com a regulamentação? Os contratos estão adequados? Os procedimentos internos estão documentados?
CONCLUSÃO
O mercado de crédito estruturado oferece oportunidades reais de crescimento e rentabilidade. Mas aproveitar essas oportunidades com segurança exige mais do que intuição ou relacionamento comercial.
A due diligence é o que separa a gestão profissional do improviso. É o que permite demonstrar boa-fé quando questionado. É o que protege o seu capital quando algo dá errado na ponta.
Para os associados do SINFAC/SC, investir em processos de análise prévia não é custo, é proteção. E em um mercado cada vez mais competitivo e regulado, proteção é diferencial.
Felipe Marcelino de Albuquerque é advogado (OAB/SC 33.415), especialista em assessoria jurídica para empresas de fomento mercantil, securitizadoras e FIDCs.
Felipe Albuquerque Advocacia
www.felipeadv.com.br
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